7 de agosto de 2016

Um gol sem gritos

"Não, mas elas devem ser sapatões, né? Mulher jogando futebol? Puff!"

"Affe! Mas a qualidade nem se compara. Homem tem mais resistência física..."

"Olha que bonitinha de maquiagem! Nem parece que luta..."

As olimpíadas começaram e, com elas, a chuva de infelicidades. Não, ser mulher nunca foi fácil. Mas, não, isso não se resume ao fato de que nós somos "responsáveis por parir" ou "responsáveis pelo laaaar". Ser mulher é ter que provar, todos os dias, que somos capazes. Não somente capazes, mas igualmente capazes.

Nos esportes parece que tudo se complica. Criou-se uma cultura de fragilidade, incapacidade e, de certa forma, desconhecimento de tudo para as mulheres. Aguentamos menos, somos muito delicadas, não sabemos nada de regras sem a ajuda de um homem, não conseguimos praticar esportes, somos desengonçadas e Deus me livre e guarde de tentarmos assumir esportes originalmente masculinos.

Os anos se passaram, a vida seguiu, mentes se abriram e muitos países colocaram suas mulheres no esporte lentamente. Aos poucos, as próprias mulheres começaram a reconhecer suas capacidades de assumir a posição de atletas. As pioneiras, em seu brilhantismo, abriram o caminho para uma nova era de capacidade. Hoje somos uma massa de mulheres esportistas? Não. Somos minoria. Ouvimos os maiores impropérios. Ainda ouvimos aquele velho "tão feminina, nem parece que luta/corre/bate/atira/joga/é casca grossa."

As olimpíadas de 2016 começaram na sexta-feira. Nossa olimpíada, as olimpíadas do Rio. Infelizmente, muitos ainda foram os países que enviaram somente homens ou pouquíssimas mulheres. Pra surpresa dos desavisados, os países africanos mantém seu brilhante projeto de empoderamento e continuam a enviar um número surpreendente de mulheres. Mesmo os menores e mais pobres. Os antigos, como a Índia, continuam a decepcionar... Mas há quem culpe a tradição.

Porém, é inevitável perceber a diferença de tratamento entre as categorias masculinas e as femininas. O exemplo é bobo, mas quantas vezes você assistiu e torceu por um campeonato mundial feminino de futebol na Globo, a grande empresa televisiva nacional? Quantas vezes aquele "grande locutor", acompanhado por seu "time de craques" e "estrelas" cobriu um jogo feminino? Quantas vezes, na sua cidade, o povo gritou pela janela um GOOOOOOOL lá do fundo da alma pela Marta, a Formiga, a Dani etc.? Quantos nomes de atletas femininas, do futebol ou não, você conhece? São mais nomes do que os masculinos?

Sou carioca dos gritos de "MEEENGOOO" pela janela. Dos gritos de "GOOOOL" até ficar rouca. O mesmo acontece aqui em Goiânia, já ouvi muitos gritos pela janela. Curiosamente, nenhum gol da seleção feminina inspira essa paixão. Silêncio. Desconfortável silêncio.

Muitas exageram na luta? Sim. Mas feminismo é mesmo besteira? Essas "feminazi loucas" só querem mesmo chamar atenção? Não existe diferença?

A diferença existe. Desde a falta dos gritos pela janela por um gol, até o desrespeito de um delegado de polícia durante a denúncia de uma agressão. Desde a falta de conhecimento de atletas, até a crença de que agressão doméstica é só briguinha de casal. Desde a crença de que, porque são mulheres, a resistência é menor, até a crença de que "a menina vagaba pediu pelo estupro."

Com o pé direito, essas olimpíadas começaram com uma medalha de ouro feminina em um esporte "de menininho". Virginia, americana, venceu no tiro ao alvo com carabina e ar a 10m. Um soco na cara de muita gente. O futebol brasileiro, lendário, hoje é carregado com honras pela seleção feminina. E muitas outras glórias de mulheres ainda virão.

Aceitem, já carregamos muitas glórias e viveremos muitas outras. O que a sociedade construiu até hoje aos poucos vai cair. No fim a verdade é que seremos igualmente boas ou muito melhores, nada menos que isso. Somos todas Martas, Sarahs, Hortênsias, Natálias, Paulas, Danis, Carlas, Maiaras, Anas, Victorias, Andressas, Jaquelines, Virginias...

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