8 de junho de 2011

Malandragem Inocente e Machismo Feminino

Viver fora é bem assim, de 5 em 5 minutos você ganha algo novo pra contar pros seus netos daqui a uns anos. É lógico que, depois de 1 ano, esse período de tempo aumenta consideravelmente e o encanto passa a rotina num piscar de olhos. Mas ainda podemos considerar, vez ou outra, ocasiões em que você diz “Essa eu vou contar pros meus netos, fazendo apresentação de Power Point, porque foi f***!”.

Sexta-feira passada teve um desses “momentos especiais”. O dia vinha sendo bem comum. Aula pela manhã, almoço gostoso com os amigos e BAM! A volta do almoço acabou sendo algo nunca antes visto na história da hu... Ok! Parei! Mas, depois que eu contar tudo, vocês me dizem se é ou não algo... Como dizer...? Peculiar!

Como voltei de um campus diferente do meu na sexta, por ter ido almoçar com a galera, peguei o trem e desci na estação mais perto da minha casa (do contrário, pegaria o monorail e desceria mais longe). Até aí, tudo belezura. Vinha andando no caminho de casa e vi os senhores que fazem a fiscalização de estacionamento irregular – o que no Japão é pra valer e dá multa MESMO (imaginem, um país desse tamanico, cheio de gente e com a galera parando o carro em qualquer lugar, né?), e eles usam câmeras e tudo mais. Quando vi os tios chegarem, já pensei: “Ih! Ó a quantidade de carro parado em local proibido! Dançaram...”. Nisso, do nada, vem um amiguinho correndo e grita: “Matte!” (“Esperem!”). Os tios gentilmente pararam, olharam para o homem e ele continuou: “Sumimasen, kusuriya ni imashita kedo...” (“Desculpe, é que eu estava na farmácia...”). Na mesma hora me veio “QUE MALANDRO! FUGIU DA MULTA COM A DESCULPA DE COMPRAR REMÉDIO! PARECE BRASILEIRO!” e minha ânsia por compartilhar informações “relevantes” me fez pegar o celular, entrar no Facebook e começar a postar aquilo ali na hora. E aí chegamos na parte interessante da história...

Enquanto caminhava pelo parque, em direção ao dormitório, postando distraidamente no celular, escuto um “Sumimasen!”. Desligada como sou e, além disso, convencida de que japoneses não abordam, nem levantei os olhos e continuei andando. Mas ouvi novamente “Sumimasen!” e não teve jeito, olhei. Um homem, de seus quase 50 anos vinha em minha direção (Notem bem! Era dia e o parque estava cheio! Inclusive onde eu estava.), com uma câmera – daquelas descartáveis – em uma das mãos pedindo que eu tirasse uma foto dele. Nem pensei duas vezes e disse que não podia, estava com pressa. Quando percebeu que eu não ia tirar a tal foto (com mais várias pessoas em volta), o homem guardou a câmera no bolso da calça e foi embora. E você me pergunta: “Ok, e o que tem de ‘peculiar’ nisso?”

Vamos à análise de detalhes... 1o: Japoneses não abordam estrangeiros para pedir qualquer coisa quando há mais japoneses por perto. 2 o: Pedir apenas para mim para tirar uma foto é um tanto ou quanto suspeito, não? Onde ele iria pedir que a foto fosse tirada? 3 o (e repetitivo): Por que, quando eu disse não, ele não pediu, por exemplo, ao velhinho que vinha mais atrás?

A verdade é que se tratava de, segundo os japoneses, um chikan. No bom e velho português, chikan quer dizer tarado. Sim senhores, fui abordada por um tarado nipônico. Daqueles que a gente sempre escuta falar, imagina andando por aí com um sobretudo e sem nada por baixo, mas nunca achou que fosse real e, no caso de nós brasileiros, nunca achou que fosse de uma abordagem tão boba (pelo menos nesse caso). Os japoneses, do meu ponto de vista, são muito inocentes em determinados aspectos, até quando tentam ser malandros.

No Japão, os casos de tentativa de assédio sexual, como essa, são muito comuns. Nos parques, nas ruas desertas à noite, nos trens lotados. E o assédio acontece sim, com muito mais frequência do que no Brasil. No caso de pedir pra tirar foto, como é o meu exemplo dali de cima, o homem pede à menina que tire uma foto, a leva para um lugar deserto e se aproveita da situação para tocar a (muitas vezes) colegial enganada. Como já aconteceu com uma amiga que recebeu o mesmo pedido e quando ela disse sim, o homem tentou levá-la para um local deserto e onde ninguém pudesse socorrê-la rapidamente ao ouvir os gritos. Também soube de casos onde o homem já abordou a moça na rua semi-nu. Entre outros...

Nosso dormitório apresenta, logo na entrada, um aviso às moradoras, que andem por ruas movimentadas e evitem andar sozinhas durante a noite. Na realidade, a forma com que o tarado japonês age é muito boba se formos comparar com os maníacos que atacam mulheres no Brasil. Longe de tentarem (e conseguirem) um estupro, os loucos daqui querem só a chance de passar a mão nos seios ou nas nádegas de uma mulher (pelo menos uma vez na vida).

O grande problema é que, se um homem colocasse as mãos nos seios de uma jovem dentro de um trem no Brasil, ele, muito provavelmente, seria “sutilmente” surrado por quem assistisse a cena e jogado pra fora do trem. No Japão, as pessoas que estão presentes e assistem esse tipo de absurdo não se manifestam e nem mesmo as próprias vítimas chegam, pelo menos, a gritar quando esse tipo de coisa acontece.

Em um país machista como o Japão, não é surpresa esse tipo de atitude por parte das mulheres. Acredito que, aqui, o que acontece é um tipo cultural e socialmente aprovado de “machismo feminino”, onde as atitudes dos homens em relação ao abuso sexual são, talvez, justificáveis; ou onde a vergonha de denunciar este tipo de coisa seja maior do que a vergonha de ficar calada, sofrendo. Aos poucos aumenta o número de avisos nas ruas dizendo que as mulheres denunciem, peçam ajuda ou que as pessoas que presenciarem cenas de abuso também tomem as devidas providências. Mas, no caso de uma sociedade milenar que não aceitas mudanças de comportamento com muita facilidade, acho que isso ainda vai demorar a acontecer por aqui.

É isso aí, meu povo... Nenhum lugar NO MUNDO é perfeito.

5 comentários:

  1. Infelizmente o Japão é um país atrasado no quisito
    de leis para auxílio e defesa da mulher! E pior é a
    mentalidade das mulheres que não reagem a tal tipo
    de coisa! Já dizia minha amiga: "pior que fazer algo
    ruim, é ser omissivo!" Realmente o Japão tem que mudar
    em certos aspectos!

    Ainda bem que nada aconteceu com vc!

    P.S.: Adorei a parte do " essa eu vou fazer uma apresentação no power point para contar para os meus
    netos!"

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  2. Menos mal o tarado japones nao eh malandro como no BR. Mas, mesmo assim, tarado eh tarado! E, vc sendo faixa preta em TKD, ter experiencia em hapkido e capoeira a permite dar um belo de um chute no saco de um desses, se vier a se repetir! Falo isso porque aqui no JP dificilmente o cara vai estar armado ameaçando sua vida!
    Mas, em todo caso, aquele spray de pimenta ja garante!

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  3. Marina, vc vai me permitir ser chato: Não existe o opressor sem o oprimido. Pra mim, as mulheres são bem mais machistas que o homem. É legal pra caramba exigir direitos, e eu acho que está muito certo. Os direitos tem que ser iguais. Mas há muitas mulheres que são machistas do tipo de exigir que o homem pague a conta sem desembolsar nada, ou exigir que o homem tome alguns tipos de atitude enquanto ela senta passivamente assistindo. E isso é tão machismo quanto aceitar uma bolinada. Seja aqui, ou em qualquer lugar do mundo, se existe machismo, é por que a maioria das mulheres são coniventes, ou até gostam. Não falo das inteligentes como você, ou dos inteligentes como eu. Afinal, somos imensa minoria. Mas acho que isso é indiscutível. Muitas mulheres, embora não assumam, apóiam e gostam do machismo.

    Até acho que nós, homens, melhoramos muito nos últimos anos. Cabia uma educação à mulher também.

    Tô vivo? Ufa, juro que parei ;)

    :********

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  4. Já sabia do fato, mas só agora li o texto. Tenho que concordar com o Vinícius: "não existe o opressor sem o oprimido." Cabe a nós, mulheres, mesmo em países onde a mulher não é considerada, como China, Japão, países de cultura muçulmana e vários outros por esse mundo, lutarmos contra esse tipo de atitude. Tanto do agressor, quanto da vítima que se omite e aceita calada.
    Demora, eu sei, é um processo lento e gradual, mas necessário.
    E, se houver uma próxima vez, nem precisa bater, como o Carlos sugeriu. Basta um recadinho no pé do ouvido, para que ele saiba, com todas as letras, que você sabe muito bem quais as intenções do sujeito. E deixar bem claro que se ele continuar você vai denunciá-lo. Acredito que no caso dos japoneses isso seria bem pior do que apanhar... Seria uma desonra maior! Não acha?

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  5. Eu acho que infelizmente a cultura do estupro, existente não apenas no Brasil está acima de uma mulher não dividir a conta.
    Até porque muitas vezes em que saí com alguém a pessoa exigiu pagar a conta enquanto eu mesma já havia pegado e aberto a minha carteira, e sinto informar que nunca saí com o homem que passou a mão em meus seios sem permissão.
    Agora, sobre estupro efetivamente é realmente triste que a mulher muitas vezes não é pela questão de força, mas pelo emocional dela que não consegue reagir. Afinal nem sempre o estuprador é um velhinho desconhecido no parque...
    No final de tudo isso é realmente bom que tenha escapado dessa só com o que poderia ter acontecido

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